Sábado pré-páscoa, exprimido entre a Sexta-Feira Santa e o Domingo. Caí uma chuvinha fina, daquelas que as gotas ficam suspensas no ar. Nada de bom na programação da tarde na TV, os amigos que puderam viajar já estão longe de Brasília. Aliais, aqui tem um ditado: “quando você passar pelo Conjunto Nacional e achar a fachada bonita, está na hora de sair de Brasília”. Tenho medo de dar uma volta de carro e achar lindo aqueles anúncios iluminados. Tédio total!
De repente, lembro da sauna na cobertura coletiva do prédio. Santa solução, Batman! Ligo para o porteiro, que confirma: está ligada desde a manhã. Beleza! Deve estar quentinha! Visto uma sunga, agarro uma toalha e corro escada acima até a laje superior do bloco, onde ficam as churrasqueiras, a piscina (na verdade um tanque disfarçado) e, meu objetivo, a sauna. Ficar deitado, suando, nos degraus de azulejo vai salvar o dia. Depois, talvez, saia para rehidratar e tomar uns chopes.
Chegando lá, vejo os sinais indicando que tudo não vai ser tão perfeito assim. No pé da porta metálica que dá acesso à sauna, uma coleção de sandálias, chinelos, tamancos e tênis. Na parede, algumas toalhas penduradas. Mais toalhas, dobradas, empilhadas em cima do muro. Putz, outros estão lá dentro, nem todos abandonaram Brasília! Não faz mal, tento me animar, vai ser legal ter alguém com quem conversar. Chuto minhas havaianas do Atlético Paranaense para longe, jogo a toalha em cima da pilha e adentro a sala quente.
O bafo quente força os olhos a piscarem, enquanto fecho a porta o mais rápido possível, para evitar a perda de calor. Quando me viro, e o foco de visão se acostuma à meia-luz, percebo que todos os outros moradores do bloco tiveram a mesma idéia, o lugar está lotado! Nos três degraus da sauna tem gente empilhada, sentados, seminus, espremidas, lado a lado. Ameaço ir embora, achando melhor ir direto ao chope. Quando estou dando meia volta, a gorda do andar debaixo vomita o velho clichê:
- Sempre cabe mais um para quem usa Rexona. Saí pro lado, Wilson (que é seu marido, um magricela), vamos lá, gente, vamos fazer espaço para o vizinho.
Todos mexem as bundas, movendo um pouco para a direita, com sorrisos forçados nos lábios. Logo, uma brecha se abre entre os corpos suados. Bem ao lado da gorda. Sou obrigado a aceitar, tendo em vista o esforço que fizeram. Agradeço e sento no pequeno espaço, tentando abstrair o pensamento da troca de suores quando minha pele esbarra na dos meus vizinhos de banco. E assim ficamos, calados, como galinhas no poleiro, transpirando coletivamente.
Um trovão soa, quebrando a meditação grupal. Um peido! Daqueles bem dados, altos, que animam reuniões de velhos geriátricos. Esse devia entrar para o Guiness, pois, além da sonoridade, longa e grave, enche o pequeno quarto azulejado com um fedor horroroso. É a fetidez das entranhas podre do ser humano alimentado de bacalhau, ovos de chocolate e outras coisas típicas da Semana Santa. A sauna vira uma câmera de gás. Entre gemidos de reclamação e nojo, alguns ameaçam abandonar o barco. Daí eu grito, meio por instinto:
- O primeiro a sair é quem peidou!
Os dissidentes levam isso a sério e voltam para seus lugares. Outros, que também queriam ir embora, desistem. Ninguém quer ficar com fama de peidão perante o condomínio e, assim, permanecemos no calor, que está beirando ficar insuportável. Depois de uns quinze minutos, a gatinha do 412, ainda com os dedos segurando o nariz para evitar cheirar o ar, reclama:
- Não agüento mais, tá muito quente, véio! Vamos acabar com isso. Já passou. Vou embora, falou?
A galera ri, dando a entender que se ela realmente se retirar, vai ficar subentendido que ela que é a flatulenta. Bonita, mas podre por dentro. A menina desiste e fica onde está. Melhor derreter, pegar uma insolação do que ser taxada de peidolenta. A gorda tem outra idéia:
- Vamos pelo menos diminuir o calor. Vamos deixar a porta aberta, daí o vapor sai e a gente fica mais à vontade.
Ninguém aceita a idéia. Falam todos de uma vez, argumentando que, se as condições ficarem propícias, o culpado nunca vai se revelar. Temos que sofrer, até que o peidão não agüente mais e assuma sua condição de porco anti-social. O calor aumenta, já estou tonto, transpiro rios de suor, a visão começa a falhar. Assim não dá, decido. Resolvo admitir tudo, me levantando e confessando timidamente, enquanto caminho em direção à saída:
- Tá bom, tá bom, fui eu. Tô fora, tchau!
Meus companheiros de bloco me olham como se fosse um criminoso, afinal, a idéia de todos ficarem na sauna até o criminoso se identificar foi minha. Quando estou saindo, um senhor, sentado bem ao lado da porta, reclama:
- Não sabe segurar não, rapaz?
- Eu não, o senhor sabe?
- Sei sim, filho.
- Então segura essa! – digo, soltando outro peido fedorento em sua cara e me mandando do lugar.
quarta-feira, março 02, 2005
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2 comentários:
Oh André, vc me fez chorar de rir. Minha barriga até doeu!
Mateus
...ai, meu maxilar...
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