sexta-feira, março 11, 2005

CADEIA DE TELEVISÃO

José Cruel nunca foi um expoente no mundo do crime. Teve sorte de nascer com esse sobrenome, pois essa alcunha nunca teria lhe sido dada se não estivesse na sua certidão de nascimento. Zé Cruel, como era conhecido na Ceilândia, desde pequeno andava com os maus elementos da sua vizinhança. Tanto que o povo começou a se acostumar com sua figura ao lado dos traficantes e criminosos locais. Lá vai o Zé Cruel, diziam, e o nome ficava gravado na cabeça do ouvinte. O marketing faz o produto e, com um apelido desses, logo ganhou fama de perigoso, apesar de não passar de um garoto de recados dos verdadeiros criminosos.

Estudou pouco, sua escola foi a rua; seus “professores”, todos procurados pela polícia. Mas não aprendeu muito, Zé Cruel era mais pose do que fato, e esse foi todo o problema. Um dia, a turma local pegou um dedo-duro, um informante da polícia infiltrado no bando. Torturaram o coitado. O corpo foi achado enterrado no lixão. O defunto era bem quisto na delegacia. O delegado queria a todo custo o assassino. Quem teria o sangue-frio para fazer uma barbaridade dessas? Foi o quê os tiras se perguntaram. Só pode ter sido obra do Zé Cruel!, responderam todos, inclusive os verdadeiros culpados, para se inocentarem. Resultado: sem ter para onde ir, traído pelos amigos, Zé foi obrigado a se refugiar num quartinho em cima de um bar de um primo, enquanto a barra não esfriava para o seu lado.

Zé Cruel está se sentindo a Anne Frank, escondido do mundo nesse quartinho minúsculo decorado com um colchão e uma TV. Nada mais. A única janela é pequena e estreita e fica colada à laje, longe do seu alcance. Fica vendo televisão 24 horas por dia, pois não se arrisca descer e ser reconhecido. É do interesse de todos que seja preso logo, então passa o seu tempo vendo a programação da Globo, SBT, Record e MaisTV. E não agüenta mais! Quanta merda!, diz para si mesmo. Isso está o deixando maluco.

Começa o dia com o Bom Dia DF, passa pela Ana Maria Braga (tem desejos secretos de matar o Louro José), pelos desenhos animados, pelo Jornal Hoje, pelas novelas mexicanas, pelo Vale A Pena Ver De Novo, pelas reprises de filmes ruins, pelos programas de fofoca, pela Hébe, pelo Leão, pelo Ratinho e termina a noite vendo a Ana Paula Padrão. Dorme pensando na telinha, na programação ruim. Seu desejo é falar para as emissoras o quão ruim é. Não é possível que eles não saibam. Ninguém merece, concluí.

Um dia, no meio da reprise vespertina de Se Meu Fusca Falasse, o primo aparece na porta e avisa: Zé, pega leve que o Ibope está lá em baixo.

Zé Cruel vê a sua chance. O Ibope? É com eles mesmo que quero falar! Eles têm que saber! Eles têm que me ouvir, vou contar a verdade sobre a TV. Desce correndo a escada, passando pelo primo, sem ouvir as advertências e protestos do parente. Está convicto de suas ações. Quer, porque quer, dar um jeito nessa programação de merda.

Quando chega no bar, o reconhecem na hora. Os quatro policiais do Batalhão de Operações Policiais Especiais sacam suas armas, imobilizam o coitado e jogam ele no camburão. Esteja preso! Não era o Ibope, mas sim o BOPE. Bem que o primo tentou avisar, mas fazer o quê, o Zé se entregou. Foi o que achou. Não percebeu que o outro tinha entendido errado.

A caminho da prisão, o policial fala para o Zé Cruel: fique tranqüilo, cara, na prisão agora tem televisão. Levou um susto com a reação do preso: nãããããããããããããããooooooooooooooooooooooooo!!!!!!!!!!!!

quinta-feira, março 10, 2005

VIVA O REI CHARLES!

Longa vida ao Charles! Viva o futuro Rei da Grã Bretanha! Estou de saco cheio de todo essas manifestações conservadoras e caretas sobre o casamento de Charles com a Camila Parker Bowles. o orelhudo teve culhão de assumir seus sentimentos pela feiosa e que se foda o resto do mundo. O amor não só é lindo, como é uma questão individual que se restringe aos envolvidos. Quem quer se meter na vida dos outros que volte ao Big Brother.

Neozelandesas protestam, mostrando os peitos. Devem morrer de inveja da noiva real, pois pelo menos os delas estão recebendo carinhos e não têm que ficar ao vento para ganhar alguma atenção. George Bush proíbe a Camila de entrar na Casa Branca porque ela é divorciada e, de acordo com o caubói fascista, causou a separação Charles e Diana. Que diabos! Queria ele que o orelhão ficasse morando com alguém que não amava? Então chifrar a Diana pode, separar não? Se o Bush fosse realmente contra o divórcio, não teria enviado soldados para a guerra, pois os traumas causados por estar em campo são a maior fonte de separação nas forças armadas.

A Rainha Elizabeth não vai ao casamento do filho. Que moralismo falso. Dizem que ela e o marido, o tal do príncipe consorte, rolam de bêbados pelos corredores do Palácio de Buckinham. Ela é que não está a fim de largar a coroa! God save the queen, the fascist regime, cantavam os Sex Pistols. Eles sabiam do que estavam falando. Charles e Camila recentemente foram vaiados pelos súditos durante uma aparição pública. Deveriam ter mandado um dedo real para todos. É muita frustração causado pela inveja da felicidade alheia.

Charles é gente boa. Diz que é fã do Darkness. Alguém com um senso de humor assim não pode ser gente ruim. Viva o Rei Charles!

quarta-feira, março 09, 2005

QUEM (OU O QUE) É A TURMA DA COLINA?

Renato Russo sempre aludia ao grupo de amigos e conhecidos que formavam o núcleo do chamado “movimento punk de Brasília” como a Turma da Colina. Muito mais do que um punhado de músicos que vieram a formar a Legião Urbana, o Capital Inicial, a Plebe Rude, a Escola de Escândalos, o Diamante Cor-de-Rosa, entre outros, faziam parte do grupo pessoas que faziam suas próprias camisetas, estavam envolvidos com fotografia, arte, serigrafia, cinema e desenvolveram um humor próprio identificável até hoje em certas rodas brasilienses. Quando íamos em bando para o Rio ou São Paulo, sempre tentavam nos rotular: vocês são punks ou new wave? Não tínhamos resposta, essa falta de identificação classificatória nunca gerou traumas em nossas cabeças. Éramos únicos, e isso é o que importava.

Para quem não sabe, a Colina não é um monte de terra onde brincávamos em cima, mas sim quatro blocos de três andares dentro do campus da Universidade de Brasília, cercada por mato, isolada no Plano Piloto, onde moravam os professores da instituição. Só que, à época do surgimento da turma, ninguém mais morava lá. Para falar a verdade, do grupo, somente quem morou na Colina foram os irmãos Felipe e Flávio (hoje no Capital), o Gutje, meu irmão Bernardo e eu. A maioria dos outros integrantes da turma nunca botou os pés no local. Morávamos lá muito antes do punk. Éramos recém adolescentes e o Russo, que ainda era Manfredini, nem conhecíamos.

Para nós, que morávamos lá, a turma da Colina era um pessoal mais velho, com jeito de hippies, que ouviam Jimi Hendrix, montavam bandas para tocar blues no térreo dos blocos, acampavam debaixo de umas árvores, liam Marx, jogavam xadrez e nos tratavam bem, mas como pirralhos. Eles, até hoje, mantêm uma ligação forte, tendo até grupo virtual na internet, do qual faço parte como ex-morador do lugar. Por isso estranho quando leio na imprensa, quando vejo na MTV, quando ouço alguém se referir às bandas de Brasília com a Turma da Colina. Sempre me lembro daqueles que foram nossos mentores àquela época.

Passei 18 meses na Inglaterra com meus pais, em 1978. Quando voltamos ao Brasil, permaneci em Curitiba por mais seis meses estudando para o vestibular. No feriado de 7 de setembro, fiz uma pausa e vim para Brasília, me reencontrando com o Fê e conhecendo o Renato Russo, o Loro, o Geraldo, o Aborto Elétrico e a Blitx 64. Saímos uma noite na Caravan laranja dos Lemos e fomos passar o tempo num balão que dividia um cruzamento na Colina. Aprendi que era um lugar favorito do pessoal. Nunca me diverti tanto, ouvindo K7s no toca-fita do carro, falando merda e planejando as bandas que montaríamos e que iriam estourar. Daí a alcunha que o Russo tacou à turma. E colou.

terça-feira, março 08, 2005

Resumo da Semana (última de fevereiro)

Leitura: História dos Videogames, artigo na web encaminhado pelo Sr. Pio, garimpador número uno da internet. O endereço é http://outerspace.terra.com.br/retrospace/materias/consoles/historiadosconsoles1.htm .

Música: Hotel Básico, disco solo de Fê Lemos. Ska-p, grupo ska mexicano.

Comida: Pipoca de microondas, sabor bacon.

Alegria: derrota dupla do Severino no Congresso: a liberação das células tronco para pesquisas e o não aumento dos deputados.

TV: Fórmula 51, filme inglês, e a transmissão de Palmeira x Santos (porco!!!!).

Notícias do Front - Voto em Branco

Ontem foi, ao meu ver, um dia histórico. Finalmente, depois de vinte e cinco anos como músico, gravei uma música com meu ex-vizinho da Colina, companheiro de adolescência, Felipe Lemos, baterista do Capital Incial. Gozado que, ele sendo baterista e eu baixista, era de se imaginar que já teríamos gravado antes. A verdade é que até tocar juntos posso contar no dedo da mão direita as ocasiões. Mas, por obra do destino, nunca entramos no mesmo estúdio. Gravamos a base de Voto em Branco no estúdio do Philippe. Música com menos de dois minutos, 198 bpm. Divertisão pura.

segunda-feira, março 07, 2005

SHOW DA PLEBE DIA 18 DE MARÇO

Sim, é isso mesmo. Dia 18 de março, uma sexta-feira, estaremos tocando no Kazebre Rock Bar, em São Paulo (me falaram que é perto de Guarulhos). Quem vai abrir são nossos brothers Phonopop (de Brasília) e Bikini Cavadão. A promoção é da Rádio 89 FM, então, qualquer dúvida, liguem para lá.

COMO NASCEM AS AMIZADES (E O PUNK BSB).

André Pretorious era uma figura. Quase dois metros de altura, um Sid Vicious loiro que lembra um pouco o Billy Idol. Filho do embaixador da África do Sul, estudava no mesmo colégio que eu, só que uma série na minha frente. Acho que a amizade começou quando nos demos conta que ambos odiavam os Rolling Stones. Isso, numa época em que as chamadas “big bands” (Led Zeppelin, Aerosmith, Lynard Skynard, Deep Purple, etc.) dominavam a cabeça dos jovens. Fomos salvos, em 1976, pelos Ramones, Clash e Pistols. No colégio inteiro, éramos os únicos a ouvir esses grupos novos. Entendíamos que algo estava acontecendo, que 1977 era um divisor de águas. Os outros insistiam em ouvir Free Bird do Lynard Skynard durante o recreio. Coisa que nos dava náuseas, nos obrigando a lanchar no parquinho, junto com os alunos do jardim de infância. Lá, pelo menos o barulho era mais digerível.

Naquele mesmo ano, aconteceu um mega-evento, uma espécie de olimpíada escolar de grande porte, no Rio de Janeiro. Oitenta por cento dos alunos da escola foram. Só ficaram para trás um bando de nerds, uns rebeldes e nós (até hoje não sei se me enquadro no primeiro ou segundo grupo...). Como a maioria dos professores também foram, criaram uma programação “alternativa” para aqueles que permaneceram em Brasília. Eram umas oficinas de arte, leitura e muito, muito tempo livre, que gastávamos ouvindo Never Mind the Bollocks, o primeiro do Clash, Rocket to Russia e uma coletânea punk da revista POP.

Mas éramos obrigados a participar das oficinas. Uma das quais, a oficina de bonecos, nos deu uma idéia genial. Na aula, um professor nos ensinava a costurar meias, calças e camisa, tudo junto, enchendo aquilo de jornal e pronto, um boneco tamanho humano estava produzido. Fazer o quê com esse manequim? Tínhamos a resposta. Naquela sexta, fui dormir na casa dele, a embaixada da África do Sul, no setor de embaixadas sul (Brasília é assim mesmo, uma redundância só!). Esperamos os pais deles ir dormir, e ainda enrolamos um pouco a mais ouvindo discos. Assim que estávamos certos que todos estavam nos braços de morfeu, saímos pelos fundos da embaixada e descemos uma rua que, àquela época, tinha mato em ambos os lados (a capital era assim, um monte de ruas cercadas por mato.) Com uma espingardinha de chumbo apagamos a luz de um dos postes e botamos o boneco deitado no meio do asfalto. Detalhe: para ficar mais realista, o André Pretorious tirou seu tênis novo e calçou o manequim de pano. Depois, nos enfiamos dentro do mato para observar a reação dos carros.

A rua era de pouco movimento. De madrugada, então, quase não passava ninguém. Escondidos, vimos as luzes do farol de um automóvel subindo a rua. Quando o motorista viu o boneco, freiou, repentinamente, e saiu disparado de ré. Rolamos de rir! Nosso plano tinha dado certo. O segundo carro desviou em cima da hora, catando o meio fio e acelerando do local. Estávamos satisfeitos. A nossa alegria terminou no terceiro carro: um patrulha da polícia. Esses pararam e examinaram o “atropelado”, descobrindo a farsa. Puxaram uma lanterna do carro e começaram a vasculhar os arredores, suas pistolas nas mãos.

O André entrou em pânico. Imagine só a vergonha: filho de embaixador pregando peças marotas na madrugada brasiliense. Também tinha o perigo da polícia, afinal, estávamos em plena ditadura. Poderiam achar que éramos terroristas de esquerda, assaltantes ou algo assim, agindo sorrateiramente para destruir embaixadas pela causa comunista. Foram minutos de tensão que pareceram horas. Acho que ouvi o Pretorious rezar, coisa que ele sempre negou.

Ficamos deitados na terra entre os capins gordura esperando os policiais desistirem. Quando ouvimos a patrulhinha ir embora, ainda não nos mexemos, temendo um guarda ter ficado para trás. Passado uns quinze minutos, levantamos, devagar, e constatamos que a costa estava limpa, poderíamos voltar para casa. Daí ouço o André xingar: puta que pariu! Que foi? pergunto. Levaram meus tênis novos, eram importados! Morremos de rir – eu mais do que ele, pois não tive que caminhar para casa de meias.

André Pretorious fundou, junto com o Renato Russo e Felipe Lemos, hoje baterista do Capital Inicial, o Aborto Elétrico, primeiro conjunto punk de Brasília. Para mim, é a figura mais importante de todo o rock candango, pela sua originalidade, energia, garra e determinação.

Notícias do Front - De volta ao ponto.

Os marcos de destruição e perda causados pelo piripaque do computador do Philippe foram rapidamente saneados pelo competentíssimo Txotxa. E tem males que vem para o bem, pois as regravações das baterias perdidas ficaram bem melhores do que as originais. Então, estamos de volta ao ponto de partida. Meu palpite: fim de março = fim das gravações.