terça-feira, julho 28, 2009

Runaways


Já que estamos na sessão naftalina e eu estou meio saudosista depois de ler o livro do Carlos Marcelo, trago à tona outro vinil que mudou a minha vida. O ano era 1976, tinha 14 anos e fui ao Carrefour fazer compras com meus pais numa noite da semana (detalhe para os curiosos: eu adoro ir ao supermercado – fui voluntariado, meu irmão ficou em casa). Uma das coisa que gostava era que o supermercado tinha uma sessão de discos e, enquanto meus pais enchiam os vários carrinhos com compras para o mês, prática comum na época da inflação, eu ficava vendo as capas.
Dois discos atraíram a minha atenção. O primeiro foi o disco de estréia do Boston. Já tinha lido algumas boas notas sobre ele. Outro foi de um grupo de meninas bem jovens chamadas Runaways. Achei diferente, nunca tinha ouvido falar. Joguei os dois LPs num dos carrinhos e, como sempre, passaram pelo caixa sem que percebessem. Assim, economizava minha mesada e voltava para casa com dois novos discos!
Noitinha, no meu quarto, com fone de ouvidos e o disco do Boston no meu 3 em 1, começo a conhecer minhas novas aquisições. Bastante decepcionado com a masturbação musical do Boston (que Boston!), coloco o LP das Runaways. Primeira música: Cherry Bomb. Simples, empolgante. A letra me é estranha, estava acostumado com os baby baby push push, do Led Zeppelin, os she’s a highway stars, do Deep Purple, os songs from the woods, do Jethro Tull. Essa falava de pais bêbados, fugir de casa, ficar a noite toda aprontando. E é cantado por meninas com 16 anos! Quase minha idade!
Na verdade, o disco me fascinou, mas me assustou também. Músicas sobre ficar doidão e perder a noção. Ficar preso em prisões de delinqüentes juvenis. Quebrar a lei. Muita informação diferente para um adolescente de 14 anos, numa época em que a gente era blindado desse tipo de coisa.
As Runaways foi um projeto do produtor, empresário e músico Kim Fowley que queria fabricar um sucesso. Já havia trabalhado com o Slade, o Soft Machine e o Ritchei Blackmore. Achou esse grupo de meninas, que contava com uma jovem Joan Jett e Rita Ford. Se baseou numa performance dos New York Dolls em Hollywood e resolveu investir. Esse primeiro disco é foda, com F maiúsculo. Só depois, ganhou rótulo de punk. Considerando a idade delas, acho genial o resultado final.
O problema foi a partir do segundo disco, quando o Kim Fowley tentou meter o dedo dele nas músicas, levando mais para o heavy blues metal e dar um ar sexy às garotas, que eram na verdade umas adolescentes rebeldes. A Joan Jett foi a primeira a se rebelar, inclusive processando a revista Playboy que publicou uma foto sua com alguns comentários sexistas. Não estava no sangue delas serem vendidas desse jeito. Mais um ponto, na minha visão!
Eu mostrava para alguns conhecidos da Colina, muito mais velhos que eu, que torciam o nariz e voltavam a ouvir seus Yes e ELP da vida. Eu insistia: “elas só têm 16 anos!!!”, nem me ouviam. No colégio, foi a mesma coisa, o pessoal só querendo Kiss e Lynard Skynard. Ainda bem que tinha amigos como o Pretorious e o Fê Lemos que entenderam de primeira sobre o que se tratava.
Ninguém estava preparado para ouvir garotas adolescentes com atitude no anos 70s. A banda acabou em 1979. Gosto de bandas assim: carreiras rápidas e contundentes. Alguém agüenta ouvir outro disco do Oasis?

PS – Descobri que querem fazer um filme sobre elas, leiam aqui.

12 comentários:

Anônimo disse...

Tbm adoro bandas com carreiras rápidas e contundentes.

Vc gosta dos Stranglers?

André Mueller disse...

Adoro os Stranglers, durante muitos anos minha "banda favorita". O JJ Burnel é um herói para mim!

André Mueller disse...

Agora, mais rápida e contundente que os New York Dolls, não há!

Pedro Só disse...

Excelente post, André!
Vou agora correndo ouvir o meu vinil!!!
Pedro Só

Paulo Henrique disse...

E o The Ruts?

Anônimo disse...

Bons tempos da discoteca do carrefour. Fazia a mesma coisa no carrinho de compras da minha mãe. Lembrou bem.

Essa discoteca era boa porque, junto com os discos, vinha acompanhada de guloseimas. Isso ativava um condicionamento pavloviano. Até hoje, ao escutar certos discos desse passado, sinto o cheiro e o gosto dos frumellos e chicletes.

De qualquer modo, X é um pouco mais velho. Foi uma das figuras mais precoces, um dos descobridores do punk rock de Brasilia. Só vim a conhecer o punk rock em 78, quando comprei um compacto do Pistols. Achei aquilo o maximo e passei a me interessar por bandas semelhantes. Já havia enchido o saco dos intermináveis solos do rock progressivo.

Posso dizer que, em 72 e 73, quando conheci o rock progressivo e pauleira, aquelas coisas hoje batidas, como o Hendrix, Sabbath, Floyd e Zeppelin, ou mesmo ELP e Yes, tudo isso modou a minha vida.

Porém, no final dos anos 70 já estava enchendo o saco daquela virtuose acrobatica. ELP e Yes haviam xaropado em solos de musica clássica.

Então, o punk rock veio nesse dinossauro como um enorme corte de gordura, uma grande renovação que abriu novos caminhos. O punk dava a chance até de fazer uma bandinha e se expressar no do it yourself.

Pela última vez, foi algo que mudou a vida de novo. Depois disso nada mais me impressionou tanto.

A explosão da música eletronica foi legal, mas, p mim, isso não foi novidade. A musica eletronica começou nos anos 30. Nos anos 70 já ouvia Kraftwerk, Tangerine Dream e etc. Funk e disco começou nos anos 60. Seja trance, house ou breakbeat, tudo é reciclagem do passado.

Finalmente, entendo a frustração de X ao tentar apresentar novidades. A grande maioria gosta de musica conhecida. Abrir a cabeça dá muito trabalho. A anta precisa que prestar atenção e decorar novos nomes e clichês. Sempre foi assim.

Anônimo disse...

Certo dia escutei um antigo disco do Rick Wakeman, aquele do Rei Artur, e quase vomitei. A quantidade de xarope classico era como um porre de licor.
Pensei: - era muito otário p/ gostar desse troço!

João disse...

Essa Cherie (vocalista) e essa Sandy (baterista) eram até bonitinhas.

dg disse...

André, como está depois do acidente do supermercado?
e a gravação do DVD, não rolou?

Tinha uns 11 anos, no início dos anos 80, quando comecei a me envolver mais com música e ganhei 3 exemplares da revista Rock Espetacular (sem os discos pq eram velhas), um sonho!
Já gostava de Joan Jett, e o seu amor pelo rock and roll, de Suzi Quatro, Clash e Police, além de todos aqueles do rock tradicional.

A música, sempre me chamou atenção pela liberdade de expressão e rebeldia inserida no contexto, e sabia que podia pular, balançar a cabeça, girar até cair e nos momentos mais insanos, até pq não sei falar inglês e imagina quanta besteira que sai!, gritar junto (penso que esse é o propósito),
quando comecei a ir a shows no food´s e entre quadras... em um desses, uma banda me chamou atenção, tinha um guitarrista com umas calças rasgadas, muito inquieto, que falava sobre política, sociedade, ditadura e de um concreto que tinha rachado, não sabia bem onde...achei o máximo!

Quanta consciência na postura daqueles lá em cima! Claro que comecei a prestar atenção e admirar aquele círculo, aquelas pessoas tão diferentes, com cabelos curtos e coloridos. A minha idéia de punk tinha uma relação com cabelos despenteados e mal cortados.
Isso mudou a minha percepção de vida!

Alguns documentários, filmes, livros, entre outros, Attitude- punk e Skinhead, SLC – punk, Ex-Drummer, This is England, hype! e o espetacular Joe Strummer - the future is unwritten – entre outros, sempre reforçam e sedimentam a idéia da importância da informação para a formação de opinião, pq também penso que a música (arte) tem poder transformador, veja o quanto o Joe Strummer foi verdadeiro em sua proposta,levando essas informações para quem quisesse ouví-lo e toda vez que vejo ou ouço, me apaixono mais.

Leio e releio a biografia do Cobain, sou um pouco mais nova que ele e por sermos contemporâneos, as experiências pessoais me aproximam.

Penso que essa identificação faz com que algumas pessoas conquistem outras pessoas, se tornando um referencial e alguns sabem aproveitar bem essa situação, como o Manfredini.

Li um post do Paulo, onde ele fala de uma entrevista que o Carlos Marcelo fez com ele sobre o livro da História do Rock de Brasília, antes do lançamento, e o tal entrevistador pegou TODAS as informações com ele e publicou uma puta matéria na revista Showbizz, não citou o verdadeiro autor e ficou com todo o crédito. Bom, eu A-DO-ROOO o Marchetti, porque ele é simples, inteligente e embora esteja bem interessada em ler o livro do Carlos, achei o acontecimento muito chato.

Bem, melhor ficar por aqui antes que comece a misturar o OÁSIS com uma MIRAGEM!

Anônimo disse...

Pois é João. Na época, seria ótimo comer Cherry e Sandy.

Anônimo disse...

Como no mito da caverna de Platão, na mudança de vida se descobre algo além da propia sombra. Escuta-se algo além da música conhecida.

E essa verdade pode ser poderosa e clara demais, pode cegar e até vaporizar o ignorante infeliz. Em certos casos, a decepção pode ser grande, pode acordar os terriveis demonios do medo, da tristeza, do ódio...

Deste modo, a boa mudança de vida, a mudança do rock n' roll, isso acontece quando se enxerga o lado de fora da realidade matrix comercial da midia, aquilo que aprisiona a mente dos consumidores otários que pedem música conhecida..

Para essa sociedade que vivemos, na modernitude reveladora dessa mudança, percebe-se o quão bundão, hipocrita, preconceituoso e medieval são as nossas tradições e "bons" costumes.

Papai Noel e coelhinho da páscoa não existem. Na TV é tudo mentira. Seja nas instituições e/ou costumes implicitos, a sociedade humana vive uma grande mentira. É tudo por dinheiro.

Enfim, não importa se vai mudar p/ melhor ou pior. O importante é se libertar das mentiras. Somente o conhecimento liberta.

CB disse...

André, só esqueceu de contar que além de fã de supermercados você era fã de tumultos em supermercados.