A festa dos 48 anos de Brasília me lembrou de uma frase que li no livro A Era dos Extremos, do historiador marxista Eric Hobsbawn. O livro trata da história do século XX e, na observação do autor, a maioria dos jovens crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado. Com isso, quis dizer que não há espaço intelectual para entender o porquê da situação atual, nem com um mínimo de planejamento para tentar mudar o futuro, mesmo que seja num microcosmo de sua própria vida.
Assim que me juntei às centenas de milhares de pessoas na esplanada me ocorreu ser muito verdade essa observação. Uma cidade com pouco menos de meio século já abriga uma população que se esqueceu as razões da capital ser onde é, de sua história, do golpe de ’64, dos anos de chumbo, da abertura, de tudo que levou a essa gente estar onde está hoje. É muito pouco tempo para esquecer um passado tão recente. Hoje se divertem na festa do Arruda. Amanhã será menos que lembranças, pois estarão pulando em águas fétidas de outra festa popular, promovido por outro governante.
Uma grande prova disso é o show do Capital Inicial, que também tem uma história de batalhas e lutas quase desconhecidas pela claque que juntavas as mãos no ar e vibrava a cada “cara” pronunciada pelo Dinho. Músicas que eu nunca havia ouvido antes eram cantadas por um milhão de vozes. Tudo bem, não ouço rádio, não vejo canal aberto, não leio Contigo. Não faço parte do público alvo da banda, mas isso não é estranho, chegar ao sucesso exluíndo do processo seus próprios pares (não eu pessoalmente, mas os que batalharam e lutaram lado a lado para estabelecer esse rock-Br)? Para uma noite tão especial, senti falta de mais material próprio, de citações do passado, não para relembrar os “bons velhos anos”, mas para dar o aval de estarem onde estão. Tirando Fátima e Veraneio Vascaína, não sabia a letra de nenhuma outra música deles.
Teve uma hora que o Dinho descreveu a sua visão de cima do palco do Congresso Nacional, dizendo ser um prédio muito pequeno, do tamanho dos homens que lá trabalham. Completou dizendo que não mereciam representar quem estava lá assistindo o Capital. Esqueceu ele que essas mesmas pessoas que o aplaudiam, eram as que colocaram os deputados e senadores lá no Congresso.
Cesar já sacava que o povo quer mesmo pane et circus.
PS – Não interpretar o texto acima como uma crítica à banda. Eles surfam o mar conforme as ondas permitam. A leitura é num contexto bem maior, usando o rock somente como referência. O show foi majestoso.
quarta-feira, abril 23, 2008
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22 comentários:
Sei que este post não tem o sentido de rancor com relação ao Capital Inicial, ainda bem. Mas acho que o Capital tem certa desconfiança em relação à Plebe em razão do que os caras aprontaram no passado. Li um vez que rolava um rumor de que tal gravadora estava interessada em assinar com o Capital. Então, numa tarde perdida de 1984 ou algo assim, num ensaio da Plebe, os caras param para intervalo e querendo matar o tempo alguém solta a idéia de dar um trote no Capital. Acho que foi o Philippe Seabra que ligou pra banda que também estava ensaiando e fez uma voz diferente. Os caras atenderam o telefone bem nervosos, crentes que iriam receber uma proposta irrecusável de contrato. Hoje, 2008, Dinho faz show de axé music e fala "cara". Deveria trocar para "meu rei".
Mas trotes e pegadinhas assim eram característica da tchurma, todos faziam, todos sofriam. Acho que está mais enraizado no passado recente, com ironias ditas em entrevistas.
Inclusive pelo blogg postado.
Queria ver se o Dinho iria entender que se trata de um contexto na qual o rock é usado como referência.
Essa é a Brasilia pós Roriz. Hoje temos outra cidade. O entorno cresceu, a população aumentou muito. Entretanto, a cidade agora se vê sucateada, necessitada de reformas, sem condições de absorver essa população.
As comerciais entupidas, os puxadinhos favelizados, os camelôs, tudo isso avança sobre os nichos da necessidades popular. Existe um engessamento cubano, no tombamento da cidade, que impede um crescimento mais planejado, racional e ordenado.
Acredito que o planejamento de uma cidade não pode ser estático. É preciso incluir dinamismo no projeto, de modo que isso possa prever e se adaptar as realidades e transformações, atendendo assim as necessidades de crescimento e mudanças. O projeto dessa cidade não pode ser eternamente esse mesmo original.
Do jeito que está, devido ao "tombamento", com isso se estabelece um crescimento irregular paralelo, coisa que acaba sacramentado pela lei de posse e decretos populistas de governador.
Sobre a continuidade das coisas, vejo isso da seguinte maneira:
Para quem foi jovem nos anos 80, a geração dos nossas avôs lutou contra o fascismo na segunda guerra mundial. Parte da geração dos nossos pais lutou contra a ditadura nos anos 60. Já a nossa geração não lutou contra nada, apenas reclamou e assistiu TV.
Já a geração atual, essa nem reclama mais. Apenas assiste TV e come biscoitos. Parece que esse consumismo levou a uma espécie de conformismo. Só pensam em diversão. Como diz o Jello, "shut up and shop".
Contudo, por detrás dessa falta de ideologia, nisso existe uma certa ignorancia e alienação. A cultura do povo está cada vez mais voltada ao individualismo, ao universo de valores comerciais da TV.
O resto é Frankstein que cresce independentemente da vontade do criador. As coisas mudam. As idéias adquirem vida propria e tomam rumos estranhos.
ANDRÉ O PRINCIPAL...COMO ESTÁ O PLEBE RUDE? LI OUTRO DIA QUE JÁ HAVIAM NOVAS CANÇÕES..ÓTIMO!!!! MAS VOU TOCAR NUM VELHO ASSUNTO O DVD DA PLEBE SAI OU NÃO SE NÃO PORQUE?
essa pilha, cara, de falar "cara", cara, cara, fui eu o cara que inventou, cara.
cara
caramba
cara
cara
ô
o gde mérito do capiinc é trazer o universo de philippe dylon para novas gerações de quarentões!
só nao vale falar pra ninguem...
tô com saudade de vcs, vieram na minha terra e sequer me visitaram
Meu querido X!!
E esse ano...vai rolar a Plebe aqui na Virada cultural de Sampa!!
Nossa city ta com saudade dos velhos Plebeus!!!
Abraço
Fernando
cara, alguem precisa falar pro fernando, cara, que ele já pode assinar sob sua alcunha mais famosa, cara!
ahahah
abs
Sobre a comercialização pop jabalizada, assim já dizia Ibrahim Sued:
"Quando o vento é forte, o CapIn se curva".
esses pervertidos...
é cada uma!
vão fechar o history channel?
lamentável
eu acho o dinho um gatinho!
pronto, falei
Falaram acima que essa geração apenas assiste tv e come biscoitos. Permita-me completar:
e ouve Capital Inicial.
tb acho o Hobsbawm muito bom; só dei uma olhada rápida no "a era dos extremos", tem fotos maravilhosas como ilustração de seus escritos e tb li parte de outro, "pessoas extraordinárias - resistência, rebelião e jazz", que só pelo título, já se percebe que é outra pérola!
confesso que não sou boa leitora, mas pretendo me redimir...
O DINHO NÃO HONRA A HISTORIA DO CAPITAL, APESAR DE FAZER PARTE DELA!
Concordo com a opinião do André e dos demais que se mostram indignados com a favelização de Brasília e a massificação do pensamento e comportamento para padrões de baixíssima crítica político-social, mas a ausência de notícias de pancadarias e badernas na enorme multidão que estava lá me fez pensar que pode haver algo positivo sim nessa nova sociedade que se forma em Brasília. Posso estar equivocada, já que não acompanho noticiários, mas se realmente os casos de violência tiverem sido pontuais e em número reduzido, considero isso um grande contraponto ao individualismo exacerbado que foi apontado no blog.
Minha opiniao sobre Brasília é que aqui vivemos o ápice da polarização social. Só que não são 2 polos. São ilhas, e são muitas, e são bem complexas. Em Brasília vejo muito explicitamente grupos de pessoas altamente politizadas e de renda média-baixa. Vejo grupos de classe alta altamente versados em cultura mundial e conscientes de seu potencial de fazer um grande bem. Vejo trupes sem nada na cabeça, esbanjando um visual que não podem sustentar financeiramente, usando pais complacentes para terem inserção social. Vejo muitos que vivem em prol do êxtase individual, sem moral, usando dinheiro público e privado para o bem de seus aliados. E vejo muita gente lutando pra influenciar na construção de bons valores, seja de sua própria família quando seu alcance social é limitado, seja de grupos maiores, de alunos, de amigos, sei lá. Acho que toda essa galera estava representada lá na esplanada, André.
Foge um pouco do assunto, mas ainda tem uma conexão. Hoje me peguei pensando no grande paradoxo que vivemos nesse país. Conseguimos o investment grade, mas precisamos avisar nossos convidados estrangeiros que precisam ter cuidado ao virem pro Brasil, que precisam passar repelente, que precisam tomar vacina de febre amarela, que precisam evitar regiões de floresta tropical. Somos África e somos G7, no mesmo lugar, só que materializado em pessoas distintas.
Foge um pouco do assunto, mas ainda tem uma conexão. Hoje me peguei pensando no grande paradoxo que vivemos nesse país. Conseguimos o investment grade, mas precisamos avisar nossos convidados estrangeiros que precisam ter cuidado ao virem pro Brasil, que precisam passar repelente, que precisam tomar vacina de febre amarela, que precisam evitar regiões de floresta tropical. Somos África e somos G7, no mesmo lugar, só que materializado em pessoas distintas.
O upgrade no investment grade do Brasil não vai melhorar as coisas tanto assim. Isso é otimo para os investidores e grandes empresas do mundo a especulação. Para as médias e pequenas, para o povo desempregado e mercado informal, isso não vai ajudar muito.
É que os gringos estão exigindo mais arrocho fiscal e um PIB maior. Ou seja: menos gastos do governo e mais vantagens para as grandes empresas aumentarem produção e lucro.
Assim, pelo menos por agora, os investimentos sociais e obras para o povão não acontecerão por causa disso. O que vai acontecer é um aumento de entrada no fluxo de capital especulativo, investidores comprando ações de grandes empresas brasileiras, aplicando no alto juro e papeis principalmente de bancos.
Enquanto isso, para assegurar o investidor estrangeiro, para manter o mercado da especulação, o arrocho fiscal, o superavit primario, isso continuará no osso.
Portanto, o país continuará todo favelizado, sucateado e fodido, nas estradas, aeroportos, portos, hospitais, escolas, previdencia social e etc. Com arrocho fiscal, não haverão investimentos do estado.
Com os juros altos, a pequena e media empresa continuam ferradas. A informalização, desemprego e bunda-lelê, tambem. Tal africanização, esse Haiti que estamos vendo, isso está apenas começando.
Uma dívida elevada certamente traz montante de juros mais alto, além de taxas mais altas para rolagem da dívida. É a lógica pura do mundo financeiro, e vale tanto para tomadores-pessoas quanto para tomadores-países. Não existe isso de emprestar dinheiro sem cobrar juros; mesmo em países islâmicos os juros são mascarados em outros termos, mas estão lá.
Não concordo que redução da dívida implica em piora social. O governo gasta mal, há estudos pontuais mostrando que a corrupção come mais de 60% da receita que deveria ser alocada em escolas/merenda escolar, etc, então daí dá pra ter uma idéia de que o dinheiro arrecadado é mais que suficiente pra fazer uma grande revolução em pontos estratégicos, para atacarmos de frente a pobreza e a desigualdade. Falta seriedade e moralidade na condução da coisa pública. Para isso acontecer, só com instituições sérias fortes e gente de caráter cobrando e participando do setor público.
Não concordo que redução da dívida implica em piora social. O governo gasta mal, há estudos pontuais mostrando que a corrupção come mais de 60% da receita que deveria ser alocada em escolas/merenda escolar, etc, então daí dá pra ter uma idéia de que o dinheiro arrecadado é mais que suficiente pra fazer uma grande revolução em pontos estratégicos, para atacarmos de frente a pobreza e a desigualdade. Falta seriedade e moralidade na condução da coisa pública. Para isso acontecer, só com instituições sérias fortes e gente de caráter cobrando e participando do setor público.
O upgrade não tem muito a ver com a redução da divida. Trata-se de uma garantia para quem quer investir na bolsa e nos bancos brasileiros. Com os juros altos e dolar baixo a divida interna do governo até aumenta.
Sim, o governo gasta mal, é verdade, mas quando tem que cortar gastos, a primeira coisa que fazem é sucatear a infraestrutura e os serviços publicos. Nunca cortam na mordomia e nos cabides de emprego.
Enfim, com o upgrade, acredito eu, isso não vai melhorar muito, a não ser que a pessoa tenha dinheiro para investir no mercado. Além disso, esse capital especulativo entra mas depois sai. Como dizia o Barbosa Lima Sobrinha, capital se faz em casa, como se faz no Japão.
A qualquer momento, caso haja uma nova crise mundial, esse dinheiro dos investidores pode sair e derrubar a bolsa, quebrar os bancos e deixar o Brasil na merda outra vez.
Na hora do oba oba especulativo, o povão não ganha nada, mas na hora da roubada acaba sobrando para o zé mané. Se os bancos quebrarem, quem dança é o zé mané que tem a conta corrente e poupança confiscadas, como aconteceu no corralito argentino e no grande golpe vigarista do Collor de Mello.
Quando pensamos em fechar um acordo de grande volume financeiro com uma empresa, há indicadores que mesmo não relacionados diretamente com o objeto da negociação, nos ajudam a avaliar a seriedade da empresa. O caso do investment grade é análogo. Concordo que precisa-se saber que ganhos de retorno no mercado financeiro podem estar refletindo otimismo exagerado e excesso de dinheiro essencialmente especulativo, e tanto as empresas que se beneficiam com melhoras nas quotações de bolsa e tanto o governo que toma decisões em momento de otimismo, precisam estar bem conscientes de que isso tudo pode se reverter se não aproveitarmos a oportunidade para arrumar a casa. Fazer arrocho quando a situação está feia pro nosso lado é bem mais penoso do que quando estamos com folga.
Aí, o último comentário foi meu.
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