Havia a disputa de quem ela mais parecia, se com a mãe ou o pai. Os amigos “tucanos” afirmavam que tinha traços dos dois. A única coisa que todos concordavam era que a Carminha era um anjinho, parecia ter descido direto do firmamento para alegrar a casa de Horácio e Cidinha, seus pais. Loira, de olhos azuis, sempre um sorrisinho nos lábios, Carminha chamava a atenção por onde passava. Parece um querubim, exclamavam maravilhados os que cruzavam com ela no seu carrinho de bebê, sendo empurrada pelo pai orgulhoso. Nunca se irritava, chorava só em último caso, dormia bem, era o neném perfeito.
Sendo um programador de sistemas, Horácio acredita somente naquilo que pode ser traduzido para a lógica. Claro que olhava com desdém as manias esotéricas de sua esposa, chegada num horóscopo, espiritista amadora e praticante Wica. Ele nem se deu ao trabalho de ler o mapa astral que a Cidinha tinha encomendado a preço de ouro do melhor astrólogo de sua cidade. Mas se deixava ela feliz, ele não se opunha.
Um dia, Horácio estava a sós na cozinha, dando uma sopa de beterraba para seu xodó. Ela sentada na sua cadeira alta, própria para bebês, e ele a sua frente, numa cadeira mais baixa. Adorava esses momentos com a Carminha, seu anjinho. Nesse dia, o programador se lembrou de uma besteira que tinha ouvido da mulher. De acordo com ela, se fosse perguntado a uma criança novinha o que tinha sido antes de nascer, a criança contaria o que tinha sido na vida passada. Achava isso uma asneira, mas, por brincadeira, resolveu tentar.
Olhou a filha bem no fundo dos olhos azuis e perguntou: Carminha, quem era você antes da nascer?
O bebê fez uma cara séria e respondeu violentamente, com uma voz rouca e grave, que mais lembrava um cantor de banda de death metal escandinava: “Átila, o Huno!”.
Com o susto, Horácio cai para trás, a sopa derramando sobre ele, tingindo seu rosto de roxo. Seu coração disparado parece que vai saltar do tórax. Olha para cima e vê sua filha com aquela expressão angelical de sempre sorrindo para ele. Sua esposa entra na cozinha e se depara com a cena. Sinceramente, Horácio, diz ela, reprovando o marido.
Desde então, Horácio nunca mais passou um momento sozinho com a filha.
quinta-feira, abril 14, 2005
NOTÍCIAS DO FRONT - 12 DE ABRIL 2005
Minha participação no disco está quase no fim - todos os baixos já estão gravados. Ontem, matamos os baixos da parte final de Suficiente por Um Dia e a segunda parte de Voto em Branco. Agora, só volto para o estúdio para gravar a voz de Voto em Branco. Estamos muito perto, muito perto mesmo do fim. Agora sei como o Stalin se sentiu quando a vitória sobre o exército de Hitler era iminente.
quarta-feira, abril 13, 2005
AFRO-LULA
Lula, não tendo mais nada a fazer em Brasília, cansado de ficar inaugurando marcos pelo país, comprou um avião novo e, para não ser acusado de não usá-lo, viaja pelo mundo a qualquer pretexto. Agora mesmo, está na África, visitando ditadores, déspotas e líderes de valores morais questionáveis. Ao ser acusado de viajar muito, o nosso presidente se defende: “negociar olho-no-olho vale mais do que 500 e-mails”. Ele deveria avisar isso aos grandes administradores que cada vez mais fecham negócios pela internet, economizando dinheiro e acelerando o processo. Mas afinal, o quê mesmo que ele foi negociar lá? Hoje é sabido que quanto mais um país se envolve em comércio com os outros, mais ele progride. Essas republiquetas que o Lula está visitando representam traço na nossa balança comercial. Seria melhor ele visitar uma França, Rússia ou China, olhar no olho e derrubar barreiras comerciais que tragam vantagens reais para o Brasil. Eu, pessoalmente, acho que ele ficou uma gracinha vestido à caráter naquela festa africana. Consigo imaginar os anfitriões se trancando no banheiro, batendo nas costas uns dos outros e gargalhando sem parar: “conseguimos colocar aquela roupa ridícula no Presidente do Brasil, há há há há há há há há há!” E a gente aqui chora com o desperdício de dinheiro público: buá buá buá!
terça-feira, abril 12, 2005
O SONO DOS JUSTOS
Como é fácil quebrar o espírito do ser humano, pensa Alexandre enquanto espera a sua vez na fila do check-in no aeroporto para voltar para casa. Agora ele entende a utilização da técnica de interrogação que consiste em deixar o interrogado acordado durante dias. Sem sono, o homem perde a noção, o contato com a realidade. Os seus bloqueios viram pó, sua esperança morre. Alexandre chega a essa conclusão como um conhecedor da causa, fazem três noites e três dias que não prega os olhos. Primeiro foi o nascimento de seu primeiro filho. Vinte e quatro horas viradas acompanhando o parto, ajudando a esposa a amamentar, caçando médicos e enfermeiras pelo hospital, agüentando choro, trocando fraldas e cuidando da recém-tornada mãe. Depois foi o show da Plebe Rude, onde trabalha como técnico de som.
Nem teve tempo de se banhar e trocar de roupa. Quando encontrou o resto da equipe no aeroporto para partir em direção à Florianópolis, todos estranharam seu jeito de vagabundo: barba por fazer, cabelo comprido todo despenteado, olheiras que os óculos escuros não conseguem esconder e um cheirinho característico de suor azedo. O Philippe não vai gostar, avisou o roadie Felipão. Todos sabem que o Philippe é muito chato com a aparência do pessoal que trabalha com a Plebe. Ele vai ter que entender, responde o Alexandre, sem maiores explicações. Na verdade, o guitarrista não notou nada, pois viajou nas poltronas da frente e o técnico de som nas últimas.
Durante o vôo, também não conseguiu dormir. O gordo do seu lado era muito espaçoso, e a velhinha não parava de falar. Sem contar que a sua poltrona não reclinava e os seus joelhos ficavam espremidos contra a mesinha. Foi um inferno. Pior a chegada na capital catarinense: direto do aeroporto para a passagem de som, onde, claro, deu tudo errado e ele teve que arrumar os cabos até a hora do show, que terminou somente às seis da manhã, hora de voltar para o aeroporto, onde se encontra agora.
Os olhos do Alexandre ardem, parece que suas lágrimas são ácido sulfúrico. Sua língua jaz morta no fundo da boca, quando tenta falar, ela nem se mexe, pediu arrego há muito tempo. Ele agüenta pacientemente na fila, junto com o resto da equipe. Quando chegam no balcão, a moça avisa que o excesso de bagagem vai custar trezentos reais. Alexandre, como costuma fazer nessas horas, tenta argumentar com ela, talvez para reduzir o custo ou deixar passar. Ela não só não entende uma palavra do que ele diz, como acha sua aparência muito esquisita, por não falar suspeita. Mantém um sorriso forçado no rosto enquanto aperta o botãozinho vermelho debaixo de sua mesa.
Temos um código 22, avisa o chefe dos seguranças do aeroporto, e sai correndo, acompanhado por outros quatro colegas, nenhum pesando menos do que cem quilos, trajados em seus ternos pretos, a-lá matrix. Em suas mãos, um bastão anti-motim com descarga elétrica de vários volts. Não foi difícil identificarem o arruaceiro. Só pode ser aquele hippy drogado lá no balcão da Gol, aponta o segurança. O primeiro choque consegue acordar a língua do Alexandre que solta um grito de agonia. O segundo o faz cair no chão. O pior foram as porradas dos cassetetes, doem em dobro, primeiro com a pancada, segundo com a voltagem descarregada no seu corpo. Sem conseguir reagir mais, o arrastam para uma cabine a prova de som.
Olha só o que ele tem na mochila, grita um dos seguranças. Alexandre, como faz em todo final de show, coloca tudo que sobra no camarim na sua mochila para distribuir entre a equipe da Plebe. Dessa vez, os músicos não consumiram quase nada e ele embolsou três Johnny Walkers Red, duas Smirnoffs e algumas latas de Inferno. É um bebum, todos concluem. Foi direto do aeroporto para a cela da delegacia.
Ivan já sabia que o Philippe ia reclamar. Não gosto de drogados na equipe, ainda mais esses que fazem confusão, avisa o guitarrista. Fica relaxado, sugere o empresário, vou me livrar dele. Alexandre não está nem aí, dorme que nem um anjo no colchão surrado de sua cela.
Nem teve tempo de se banhar e trocar de roupa. Quando encontrou o resto da equipe no aeroporto para partir em direção à Florianópolis, todos estranharam seu jeito de vagabundo: barba por fazer, cabelo comprido todo despenteado, olheiras que os óculos escuros não conseguem esconder e um cheirinho característico de suor azedo. O Philippe não vai gostar, avisou o roadie Felipão. Todos sabem que o Philippe é muito chato com a aparência do pessoal que trabalha com a Plebe. Ele vai ter que entender, responde o Alexandre, sem maiores explicações. Na verdade, o guitarrista não notou nada, pois viajou nas poltronas da frente e o técnico de som nas últimas.
Durante o vôo, também não conseguiu dormir. O gordo do seu lado era muito espaçoso, e a velhinha não parava de falar. Sem contar que a sua poltrona não reclinava e os seus joelhos ficavam espremidos contra a mesinha. Foi um inferno. Pior a chegada na capital catarinense: direto do aeroporto para a passagem de som, onde, claro, deu tudo errado e ele teve que arrumar os cabos até a hora do show, que terminou somente às seis da manhã, hora de voltar para o aeroporto, onde se encontra agora.
Os olhos do Alexandre ardem, parece que suas lágrimas são ácido sulfúrico. Sua língua jaz morta no fundo da boca, quando tenta falar, ela nem se mexe, pediu arrego há muito tempo. Ele agüenta pacientemente na fila, junto com o resto da equipe. Quando chegam no balcão, a moça avisa que o excesso de bagagem vai custar trezentos reais. Alexandre, como costuma fazer nessas horas, tenta argumentar com ela, talvez para reduzir o custo ou deixar passar. Ela não só não entende uma palavra do que ele diz, como acha sua aparência muito esquisita, por não falar suspeita. Mantém um sorriso forçado no rosto enquanto aperta o botãozinho vermelho debaixo de sua mesa.
Temos um código 22, avisa o chefe dos seguranças do aeroporto, e sai correndo, acompanhado por outros quatro colegas, nenhum pesando menos do que cem quilos, trajados em seus ternos pretos, a-lá matrix. Em suas mãos, um bastão anti-motim com descarga elétrica de vários volts. Não foi difícil identificarem o arruaceiro. Só pode ser aquele hippy drogado lá no balcão da Gol, aponta o segurança. O primeiro choque consegue acordar a língua do Alexandre que solta um grito de agonia. O segundo o faz cair no chão. O pior foram as porradas dos cassetetes, doem em dobro, primeiro com a pancada, segundo com a voltagem descarregada no seu corpo. Sem conseguir reagir mais, o arrastam para uma cabine a prova de som.
Olha só o que ele tem na mochila, grita um dos seguranças. Alexandre, como faz em todo final de show, coloca tudo que sobra no camarim na sua mochila para distribuir entre a equipe da Plebe. Dessa vez, os músicos não consumiram quase nada e ele embolsou três Johnny Walkers Red, duas Smirnoffs e algumas latas de Inferno. É um bebum, todos concluem. Foi direto do aeroporto para a cela da delegacia.
Ivan já sabia que o Philippe ia reclamar. Não gosto de drogados na equipe, ainda mais esses que fazem confusão, avisa o guitarrista. Fica relaxado, sugere o empresário, vou me livrar dele. Alexandre não está nem aí, dorme que nem um anjo no colchão surrado de sua cela.
COMO FOI A RAVE E NOTÍCIAS DO FRONT
Foi uma massa negra, e foi massa! Até a vodca era negra! Mordo a língua e abaixo a cabeça em respeito e admiração, a 7ª Thorns Rave Gótica foi muito bem organizada, freqüentada e executada. No Clube dos Bancários, um imenso resort sindical em São Bernado, SP, se reuniram mais de cinco mil jovens (e mais tantos velhos) vestidos de vampiros, gárgulas, noivas, coveiros e outras variações do tema. Divertiram-se muito e nós também. O show foi impecável, rolando até um triz, cover do I Fought the Law, do Clash. E o público ainda queria mais.
Depois do show, acompanhado pela Fernanda, namorada do Philippe, e o Txotxa, super batera, dei uma rolé pelo lugar. Demos muita risada com a dança do ventre para uma platéia de darks que a gente tinha certeza que ia se levantar, sacrificar a moça e beber o seu sangue. Coisa que não aconteceu. O show do Das Ich me agradou muito também, me remetendo a um passado no qual ouvia muito EBM e coisas do gênero. Pena que não tirei fotos, o povo estava bem à caráter, tornando o clima perfeito para a ressurreição do Bela Lugosi.
Boas notícias do front, também. O Clemente esteve em Brasília e terminou a sua participação n o disco. Gravou todas as vozes e guitarras. Pessoal, estamos muito próximo do fim. Faltam detalhes, somente detalhes. Espero que a próxima vez que postar novas sobre a gravação seja para anunciar a sua finalização.
Depois do show, acompanhado pela Fernanda, namorada do Philippe, e o Txotxa, super batera, dei uma rolé pelo lugar. Demos muita risada com a dança do ventre para uma platéia de darks que a gente tinha certeza que ia se levantar, sacrificar a moça e beber o seu sangue. Coisa que não aconteceu. O show do Das Ich me agradou muito também, me remetendo a um passado no qual ouvia muito EBM e coisas do gênero. Pena que não tirei fotos, o povo estava bem à caráter, tornando o clima perfeito para a ressurreição do Bela Lugosi.
Boas notícias do front, também. O Clemente esteve em Brasília e terminou a sua participação n o disco. Gravou todas as vozes e guitarras. Pessoal, estamos muito próximo do fim. Faltam detalhes, somente detalhes. Espero que a próxima vez que postar novas sobre a gravação seja para anunciar a sua finalização.
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