sexta-feira, fevereiro 10, 2006

A semana que trabalhei para o Rod Stewart

Acho que foi em 1990 que a Pepsi lançou o primeiro refrigerante diet no país. Para fazer bonito, convidaram para fazer a campanha publicitária ninguém menos do que o Rod Stewart, que iria fazer um monte de shows pelo Brasil e gravar uma propaganda, acho que contracenando com o Evandro Mesquita. A Plebe estava num mar de calmaria em se tratando de shows, a grana estava baixa e o Naldo, aquele nosso empresário, arrumou uma boca trabalhando na produção da Pepsi. Um dia recebo um telefonema dele, me dizendo que estão precisando de um intérprete bilíngüe para o cara e se eu estava interessado. Claro!, falei, vamos nessa!

O trabalho era simples, deveria ficar no lobby do Hotel Sheraton, na Avenida Niemeyer, onde a comitiva do roqueiro inglês estava hospedada, a postos para qualquer necessidade que surgisse. Teria, também, que acompanhar o Rod até o Santos Dumont, de onde ele saía em jatinho particular para os shows, retornando ao Rio após os eventos (coisa chique!). Então eu quase não dormia, ficava entediado no lobby, sem nada para fazer, pois o velhaco nunca saia do quarto. Só encontrava ele indo ou vindo do aeroporto.

O gozado é que o Rod nunca dirigia a palavra para mim, sempre falava comigo por meio de seu empresário. Tipo: diga para ele que estou com fome e quero um sanduíche. O empresário virava para mim e repetia: o Rod tá com fome e quer um sanduíche. E eu respondia para o Rod, que não me olhava nos olhos: ok, vou providenciar. Cara chato e snobe.

Durante a semana, dois fatos marcantes aconteceram. Primeiro, ao chegar de madrugada de Florianópolis, o Rod pede, via seu empresário, claro, que quer que eu providencie, para a manhã seguinte, um iate para ele passear. Dentro do iate ele quer sushi, champanhe, talheres de prata e taças de cristal. Eram umas quatro da manhã, onde eu ia arrumar aquilo? A solução foi ligar para a produção, tirar eles da cama e passar a bola. Tudo certo, conseguiram o iate, com todas as regalias solicitadas. O que o Rod faz? Dorme o dia todo e esquece do iate, que ficou estacionado na marina! Belo gasto do dinheiro da Pepsi!

Acompanhando o velho vocalista, estava a playmate do ano da Playboy americana do, aquela votada como a mais gostosa pelos onanistas, leitores da revista. Lá pelos últimos dias da turnê, o empresário me chama e diz que eu deveria acompanhá-la ao Galeão, pois estava retornando aos EUA. No carro, ela chorava o tempo todo. Saquei que o Rod Stewart tinha dado um pé na bunda dela, deve ter enjoado.

Finalmente o show do Rio! Meu contrato era trabalhar até a ida para o show, colocar todos no ônibus e pronto, estava livre. Fiz isso, coloquei a equipe no respectivo veículo, os músicos noutro e o Rod numa limusine improvisada (vá tentar andar de limusine no transito do Rio, mané!). Daí o empresário se virou para mim e falou: vamos nessa, vem curtir o show. Respondi: sou punk, odeio a música desse cara, vou para casa. E fui.

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

O dia em que entrevistei o Johnny Ramone

Em 1992 os Ramones estiveram no Brasil, fazendo shows em São Paulo e no Rio de Janeiro. Por algum motivo, os brothers estavam de birra com a imprensa e não queriam dar entrevistas. Meu amigo Tom Leão, do Globo, responsável pelo sensacional Rio Fanzine, negociou com o empresário deles se falariam não com um repórter, mas com um músico. Aceitaram, e esse músico fui eu.

Lá fomos nós, o Tom e eu, para o Canecão assistir a passagem de som. Nos informaram que após a passagem, o Johnny ira conversar com a gente. Dito e feito, terminou a passagem de som, nos levaram até um quarto vazio, só com duas cadeiras dentro, sem janelas, onde ficamos esperando o guitarrista. Após alguns minutos entram no recinto o Johnny, com cara emburrada, demonstrando tédio, deixando claro que queria estar em outro lugar. Perguntou quem era o músico, me identifiquei. Ele sentou numa cadeira, eu na outra e o Tom foi obrigado a ficar de pé, num canto, sem interferir na conversa.

Papo vai, papo vem, o cara foi se abrindo. Para tornar a coisa mais interessante para ele, não me fixei em perguntas óbvias, tipo que guitarra ele usava, se conhecia música brasileira (odeio quando fazem essa pergunta!) ou sobre a história dos Ramones. Começamos falando sobre a música R.A.M.O.N.E.S. que o Motorhead tinha gravado. Ele se mostrou satisfeito com a homenagem, mas, quando perguntado se iria retribuir, respondeu: de jeito nenhum!

Teve uma hora que uns funcionários do Canecão entraram no quarto com quentinhas na mão, o almoço deles. Johnny quis saber que era aquilo. Expliquei um pouco sobre o que era PF – prato feito. Ele pediu para ver, dentro tinha arroz, feijão, macarrão, bife acebolado e uma saladinha básica de tomate e salada. Ele adorou! Reclamou que era isso que queria comer, não a comida “chique” que a produção estava providenciando. Respondi que em qualquer pé sujo ele acha PFs.

Falamos de beisebol, sua paixão, de Reagan, que ele idolatrava, e me confessou cansado de estar na banda, entediado. Na época, ainda era casado com minha primeira esposa, que estava aguardando minha filha. No final do papo dei uma de fã: estou esperando um filho, o nome que você der é o que vou dar. Ele riu, agradeceu, mas se recusou. Ufa, respirei aliviado!

O show naquela noite por pouco não termina em tragédia. Um skinhead soltou uma bomba de gás lacrimogêneo dentro do Canecão e o público, em pânico, saiu feito um estouro de manada. Consegui me salvar pulando de mesa em mesa rumo à saída. O Vital (aquele da música dos Paralamas) não só foi pisoteado, como um skin o agarrou na confusão e começou a dar socos no coitado. No final, salvo no lado de fora, teceu a grande frase: eu vi a morte, e ela era careca.

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

O dia em que fui tradutor para o Ian McKay

No mesmo ano em que o Jello Biafra esteve em solo tupiniquim, alguns meses depois, esteve também o Ian McKay, acompanhando o seu Fugazi. Para quem não tem noção, esse cara foi responsável pela formação do movimento Straight Edge, fundador do selo Dischord, que lançou os principais hardcores americanos da costa leste, líder do Minor Threat, sua primeira banda - é símbolo de independência no mercado fonográfico, até hoje o selo é gerenciado do quarto na casa dos pais. O cara merece que fiquemos de joelhos, façamos referência ao tempo que entoemos Caramuru, Caramuru!

O Ian deu uma coletiva para alguns fanzines – lembram de fanzines, o que aconteceu que sumiram?!?! – e eu fui o tradutor simultâneo. Foi muito divertido, especialmente quando um fanzinjornalista perguntou, todo sério: “tem um compacto de (esqueci qual banda que ele falou) que se chama Ian McKay e tem na capa a foto de um cu, isso foi homenagem?" Eu traduzi, me segurando para não rir. O Ian respondeu que o cara deveria ser doente por considerar que o nome dentro de um cu era homenagem. Todos riram pra caralho.

O show, de novo no Circo foi impecável. Fugazi é a banda que mais tem músicos competentes por metro quadrado de palco que eu conheço. Foi um bom ano, Jello e McKay, os símbolos vivos da indpendência, do DIY, do protesto unido à boa música.

Em 1998, o Fugazi veio tocar em Brasília, ninguém foi! Foi quando cheguei à conclusão que o rock brasiliense estava morto. Como é que uma banda dessas vem tocar aqui e ninguém se interessa e o Chiclete com Banana vem três vezes por ano e toca para públicos de milhares de pessoas? Realmente, hoje, Brasília é um mausoléu disfarçado de cidade. Só o Fugazi para provar isso.

terça-feira, fevereiro 07, 2006

o dia que dei carona para Jello Biafra

Estava no meu Monza 86 dirigindo pela Avenida Brasil; transito maluco, um calor insuportável e dentro do meu carro dois caronas ilustres. Olho para o lado para ter certeza que não estou sonhando. É ele mesmo, ao meu lado, Jello Biafra! Verifico pelo espelho e comprovo que no banco de trás está sentado o Paul Barker, baixista do Ministry. Tinha ido pegar os dois que chegaram ao Brasil para promover o livro Barulho do André Barsinski, lançado naquele ano de 1991. Seriam dois eventos, uma tarde de autógrafos na loja de CDs que tinha com o Dado, a Rock It!, e um show no Circo Voador com o Andréas do Sepultura na Guitarra.

Tentando matar o tempo e fazer conversa, aponto para um outdoor do Rambo III e pergunto ao Jello: você vai ver? Pra que!?! Recebi um sermão que durou a ida inteira até o hotel, em Botafogo, sobre o imperialismo americano, Hollywood como ferramenta de lavagem cerebral das grandes corporações e Ronald Regan. Tudo que queria era jogar conversa fora. Esperto foi o Barker que ficou calado o trajeto todo. Vai ver que no avião tinha cometido o erro de ativar a matraca política do Jello e agora agia como gato escaldado.

A tarde de autógrafos na loja foi um sucesso. O Jello já estava mais simpático e, no fundo, saquei que gostava da fama, embora não podia admitir. Conversando, descobri que era vegetariano, fazia ioga, só ouvia vinil e como tinha uma imagem a guardar não fumava, se drogava, bebia ou ficava com mulher em público (até agora não entendi essa parte). O que mais me surpreendeu foi o conhecimento do Biafra quanto às bandas de rock brasileiras. Conhecia até Escola de Escândalos. Confessou-me que era uma espécie de Imelda Marcos com LPs, tinha uma quantidade absurda. Tentou encontrar em todos os sebos o disco Módulo 1000, banda psicodélica dos anos 60s/70s de Zé Ramalho, acho. Gozado que baixando música no Soul Seek, hoje eu tenho esse disco, que é muito bom.

O show no Circo foi marcante. O ponto alto foi um mosh do Jello Biafra que caiu no público e foi jogado no palco quase pelado. O Freddy, nosso roadie, até hoje tem um pedaço de sua calça.

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

O dia que esbarrei no Robert Smith

O Cure estava tocando no Maracanãzinho, a Plebe não tinha show naquela data e eu estava no Rio de Janeiro sem ingresso! O ano era 1987, a primeira vinda do grupo ao Brasil. Mas eu ainda tinha um trunfo na mão: a Manchete ia filmar o show e o Gregório, nosso técnico de som, estava encarregado da gravação do áudio. Com poucos telefonemas resolvi a questão, o Greg colocaria meu nome e do roadie Freddy na lista de convidados da TV Manchete.

Amigos de Brasília alugaram um ônibus e vieram em peso. Chegaram aqui com mais álcool do que hemoglobina no sangue e saíram piores ainda, mas isso é outra história. De última hora, o Freddy fura, mas o Nicolau El-moor, grande amigo e fotógrafo (as fotos no novo CD são dele, assim como as do Nunca Fomos), aparece do nada e decidimos ir juntos.

No portão de fundo do estádio, conseguimos chamar a atenção do encarregado e solicitamos entrar, pois estamos na lista. Nomes?, pergunta o homem. André Mueller e....er....Freddy, respondo. Freddy de quê?, quer saber. Caralho, não consegui lembrar o sobrenome do Freddy para que o Nicolau pudesse entrar fingindo ser ele! Silva!, responde o Nicolau. Não, é Fonseca, diz o segurança. Gaguejamos, inventamos qualquer coisa e, finalmente, o cara cede e entramos, pelos fundos.

Boca-livre, assistimos o show de lugar privilegiado, sempre com um copo na mão, na lateral do palco. Bebida vai, bebida vem, termina o show, hora de ir embora. O Maracanãzinho tem um labirinto dentro dele, não conseguimos achar a saída. A bebida no cérebro não ajuda. Depois de uns quinze minutos rodando entre corredores, cabos, pessoas e escuridão, achamos uma porta e saímos. Nos damos de frente com torcedores do Vasco, que havia perdido, saindo putos do Maracanã. Derepente, aparece um ônibus e dentro dele: o Cure! A gente aponta para o Robert Smith que começa a dar tchauzinho com ambas as mão e balançar a cabeça, lateralmente, como um ursinho de pelúcia. A gente, pra lá de Bagdá, levantamos nossas mãos, dedo do meio para cima e mandamos um fuck-off para ele. Por alguma razão, os vascaínos compraram nossa briga e começam a xingar o Bob Smith, que se assusta com o tumulto, gente batendo na sua janela e gritando ofensas incompreensíveis, fecha as cortinas e apaga as luzes. O ônibus sai e a gente fica rindo, sem saber o porquê de tudo aquilo.