terça-feira, abril 12, 2005

O SONO DOS JUSTOS

Como é fácil quebrar o espírito do ser humano, pensa Alexandre enquanto espera a sua vez na fila do check-in no aeroporto para voltar para casa. Agora ele entende a utilização da técnica de interrogação que consiste em deixar o interrogado acordado durante dias. Sem sono, o homem perde a noção, o contato com a realidade. Os seus bloqueios viram pó, sua esperança morre. Alexandre chega a essa conclusão como um conhecedor da causa, fazem três noites e três dias que não prega os olhos. Primeiro foi o nascimento de seu primeiro filho. Vinte e quatro horas viradas acompanhando o parto, ajudando a esposa a amamentar, caçando médicos e enfermeiras pelo hospital, agüentando choro, trocando fraldas e cuidando da recém-tornada mãe. Depois foi o show da Plebe Rude, onde trabalha como técnico de som.

Nem teve tempo de se banhar e trocar de roupa. Quando encontrou o resto da equipe no aeroporto para partir em direção à Florianópolis, todos estranharam seu jeito de vagabundo: barba por fazer, cabelo comprido todo despenteado, olheiras que os óculos escuros não conseguem esconder e um cheirinho característico de suor azedo. O Philippe não vai gostar, avisou o roadie Felipão. Todos sabem que o Philippe é muito chato com a aparência do pessoal que trabalha com a Plebe. Ele vai ter que entender, responde o Alexandre, sem maiores explicações. Na verdade, o guitarrista não notou nada, pois viajou nas poltronas da frente e o técnico de som nas últimas.

Durante o vôo, também não conseguiu dormir. O gordo do seu lado era muito espaçoso, e a velhinha não parava de falar. Sem contar que a sua poltrona não reclinava e os seus joelhos ficavam espremidos contra a mesinha. Foi um inferno. Pior a chegada na capital catarinense: direto do aeroporto para a passagem de som, onde, claro, deu tudo errado e ele teve que arrumar os cabos até a hora do show, que terminou somente às seis da manhã, hora de voltar para o aeroporto, onde se encontra agora.

Os olhos do Alexandre ardem, parece que suas lágrimas são ácido sulfúrico. Sua língua jaz morta no fundo da boca, quando tenta falar, ela nem se mexe, pediu arrego há muito tempo. Ele agüenta pacientemente na fila, junto com o resto da equipe. Quando chegam no balcão, a moça avisa que o excesso de bagagem vai custar trezentos reais. Alexandre, como costuma fazer nessas horas, tenta argumentar com ela, talvez para reduzir o custo ou deixar passar. Ela não só não entende uma palavra do que ele diz, como acha sua aparência muito esquisita, por não falar suspeita. Mantém um sorriso forçado no rosto enquanto aperta o botãozinho vermelho debaixo de sua mesa.

Temos um código 22, avisa o chefe dos seguranças do aeroporto, e sai correndo, acompanhado por outros quatro colegas, nenhum pesando menos do que cem quilos, trajados em seus ternos pretos, a-lá matrix. Em suas mãos, um bastão anti-motim com descarga elétrica de vários volts. Não foi difícil identificarem o arruaceiro. Só pode ser aquele hippy drogado lá no balcão da Gol, aponta o segurança. O primeiro choque consegue acordar a língua do Alexandre que solta um grito de agonia. O segundo o faz cair no chão. O pior foram as porradas dos cassetetes, doem em dobro, primeiro com a pancada, segundo com a voltagem descarregada no seu corpo. Sem conseguir reagir mais, o arrastam para uma cabine a prova de som.

Olha só o que ele tem na mochila, grita um dos seguranças. Alexandre, como faz em todo final de show, coloca tudo que sobra no camarim na sua mochila para distribuir entre a equipe da Plebe. Dessa vez, os músicos não consumiram quase nada e ele embolsou três Johnny Walkers Red, duas Smirnoffs e algumas latas de Inferno. É um bebum, todos concluem. Foi direto do aeroporto para a cela da delegacia.

Ivan já sabia que o Philippe ia reclamar. Não gosto de drogados na equipe, ainda mais esses que fazem confusão, avisa o guitarrista. Fica relaxado, sugere o empresário, vou me livrar dele. Alexandre não está nem aí, dorme que nem um anjo no colchão surrado de sua cela.

6 comentários:

Anônimo disse...

hahaha. só mil volts mesmo dão conta de inverter a lógica carioca de ganhar tudo no grito. muito boa, mesmo. chorei de rir só de imaginar o alexandre levando porrada de cacetete, sendo eletrocutado e com a mochila cheia de bebida. hahaha.

daaaassss ich!

Anônimo disse...

o andre,eu poderia pedir pra vcs virem pro rio mais uma vez...so que porra...eu to ficando impaciente com o novo cd!!!eu quero ouvir logo!!!deve estar muito foda!!!e vou ficar grudado na grade no show de estreia da nova turne aqui no rio gritando:
´´a plebe ta de volta,aha uhu!!´´
é nessa hora que deve passar pela cabeça de voces:
´´que frio na espinha apesar do calor´´
eu nao sei pq,mas sempre qdo eu ouço o enquanto que a tregua nao vem fico com um frio na espinha nessa hora...estranho...
e o site???eu entro 3 vezes ao dia vendo se ja saiu aquele maldito r ao contrario!quando vai ficar pronto??quando fãs necessitados pela plebe como eu vao poder desfrutar dele??
sacanagem...po,parabens msm pela gravaçao do novo disco e espero que nao demore muito para ser lançado...se nao eu vou ficar maluco aqui...
vlw andre!

André Mueller disse...

Calma, Gabriel. Se vc está ancioso, imagine a gente! Espero que logo vc e muitos outros consigam ouvir e dar o seu aval.

Anônimo disse...

Aí André a Plebe ainda pode fazer outros Shows aqui em São Paulo?
Eu também aguardo anciosamente o novo CD! Falando nisso uma possivel negociação com a gravadora poderia ter a possibilidade de ter os discos anteriores relançados?
Sobre o site de vcs vai ser o de domínio ".com.br" mesmo, e quanto ao dominio ".com"? pois com o "web archyve" dá pra visualiza-lo" como era até 2002...

Desculpe tanta pergunta cara flw.

Anônimo disse...

E aí Ándré? Nos próximos shows em São Paulo, em que o Alexandre estiver cansado, posso dar uma força. Aliás não tem estágio para roadie, não? Nem precisa ser remunerado. Hehehe.

Quanto ao cd da Plebe, tb estou ansioso. Mas a demora também, pode ser uma boa forma de divulgação. Vejam o "novo cd" do Guns, chinese democracy, que está quase 5 anos para ser lançado e já é pra lá de conhecido.

Vida longa a Plebe

André Mueller disse...

Igor: sim, faremos shows onde chamarem a gente. São os donos dos locais nos quais tocamos que dão o primeiro passo. Relançamento de qq disco é com a EMI, dona das obras. Mas acho bem provável que se o novo CD funcionar, eles relançarão os outros. Quanto ao site, ainda estamos nos primeiros passos de montá-lo. A prioridade agora é o disco.